sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Poeta Baiano Valdeck Almeida de Jesus


Nasci em Jequié-BA em 1966 e fui morar na Fazenda Turmalina aos seis anos de idade, porque meu pai tinha viajado pra cuidar da saúde em São Paulo e minha mãe ficou com quatro filhos. Ela era doente e não conseguiu alimentar a família, pagar aluguel de casa etc. Moramos lá até meus doze anos, quando voltei pra continuar os estudos. Minha mãe voltou com meus irmãos um ano depois. Moro na capital baiana desde 1993. Hoje sou jornalista, escritor e poeta, Embaixador da DivineAcadémieFrançaisedesArts, LettresetCulture e Embaixador Universal da Paz. Filiado à União Brasileira de Escritores – UBE e Membro-Fundador da União Baiana de Escritores – UBESC. Sou Cônsul do Parlamento Nacional de Escritores da Colômbia (2013 a 2015), autor de 21 livros e coautor de 120 antologias. Ex-presidente do Colegiado Setorial de Literatura da Bahia (2012/2014) e atual Conselheiro do PMLLB de Salvador-BA (2014/2016).


- Como foi e quando se deu a sua descoberta pela poesia?

Minha mãe era analfabeta e meu pai não parava em casa. Ele também não sabia ler nem escrever. Mas ambos contavam histórias fantásticas de castelos, princesas, monstros... Depois que cresci descobri que muitas das coisas que eles diziam eram de cordéis. Quando comecei a ler, eu devorava de tudo: rótulos de shampoos, bulas de remédio, qualquer papel que caísse em minhas mãos. Eu descobri um mundo maravilhoso, que era o mundo das letras. Cada texto que eu lia era como entrar num portal que me transportava para outra dimensão. Minha vida sempre foi de pobreza, não tinha quase nada em casa, nem TV, livros, nada. Então, as viagens que eu fazia na literatura e em qualquer escrito que eu achasse me tirava da realidade me levava para um lugar mágico. Isso me fez ficar viciado em leitura.

Outros contatos que tive com a literatura: revistas em quadrinhos, na fazenda onde morei. Ali havia uma biblioteca na casa da fazendeira. A janela de uma das salas tinha um problema e não fechava direito. Eu aproveitava quando ela viajava, entrava na casa e carregava dezenas de revistinhas, lia todas e recolocava no lugar. Isso aconteceu por vários anos. Minha curiosidade por leitura era muito grande, e ainda continua, hoje, claro, sou mais seletivo, mas aprecio qualquer gênero, qualquer formato.

Por conta dessa paixão participo de vários coletivos de literatura, atuo tanto na sociedade civil organizada como em grupos iniciantes, me aventuro a contar estórias e tudo o mais.

Além da poesia, eu me atrevo em outras criações: contos, romances, cordéis. Já publiquei também em inglês, espanhol, italiano, holandês e alemão.

- Gostaria de saber como você vê a Literatura no Brasil?

Uma efervescência de criações. Atualmente a facilidade de escrita e publicação na internet e autopublicação tem permitido a mais e mais brasileiros colocarem suas experiências no mundo e compartilharem com outros. Fico muito feliz que isso aconteça, mesmo que eu não consiga acompanhar tudo, mas é um momento maravilhoso, de liberdade de expressão, em que cada verdade é uma parte de um grande mosaico. Leio muito e acompanho muitas produções de vários autores e percebo quanto diverso é o meu país; e esta língua portuguesa permite tanta diversidade, tantos pontos de vista e isso tudo me fascina.
Em Salvador, em 2009, participei da fundação do Projeto Fala Escritor, que ainda atua na cidade, com microfone aberto a quem queira declamar, recitar ou ler um texto. Desde essa época já nasceram e recomeçaram outros grupos de escritores e poetas. Atualmente mantenho um blog onde divulgo os contatos e datas de saraus desses coletivos.
Tenho atuado muito no Sarau da Onça, há três anos, e aprendido muito com os organizadores, frequentadores e simpatizantes deste coletivo, que se situa na periferia de Sussuarana. Dali eles partem para ações em vários bairros, cidades, estados e até no exterior, como Genebra, Madri e Cartagena de Índias. Este grupo, junto com o Grupo Ágape, realizam oficinas, saraus, palestras, recitais, encontros de saraus e outras atividades, e eu sempre tento acompanhá-los. É um dos melhores exemplos de atuação da sociedade civil, modelo que já vem sendo adotado por vários coletivos.


- Quais as influências na infância e adolescência que contribuíram para a formação do poeta?

As contações de histórias de minha mãe, Paula Almeida de Jesus, foram de fundamental importância para me cativarem e me inspirarem. Era um tempo em que o convívio familiar era muito mais importante do que as carreiras, o vestibular. Ouvi muitos cordéis que ela sabia de memória, fantasiei muito com os contos de fadas. Depois vieram poemas, através de livretos que eu comprei na escola. Peguei o gosto e não parei mais.

Durante o período de escola normal e universidade, claro que o foco se voltou para livros técnicos e científicos, mas não parei de todo de degustar boa literatura. Mantenho um perfil no site www.skoob.com.br, onde posto os livros que estou lendo, que já li ou pretendo ler. É uma prática muito saudável a leitura.
Livros que tenho lido ultimamente: Ensaio sobre a cegueira (José Saramago); Cem anos de solidão (Gabriel García Marquez), Nossos Ossos (Marcelino Freire), Namíbia, Não (Aldri Anunciação), Os encantos do sol (MayrantGallo), A tristeza extraordinária do leopardo-das-neves (JocaReinersTerron), Correntezas (Lívia Natália), Um anjo de cem asas (Jorge Baptista Carrano), Cabaré (Luiz Menezes de Miranda), Contrassonetos (Alex Simões), Na pata do cavalo tem sete abismos (Clarissa Macedo), Poesias de Inverno (TaíssaCazumbá), dDeus (Miró), O Bullying do Bully (Lucas Yuri), Gramática da Ira (Nelson Maca).


- Você possui e publica seus trabalhos no blog Galinha Pulando. A internet tem contribuído para difusão do seu trabalho?

A maior parte de minhas publicações é feita na internet. É o meio mais fácil, prático e barato de publicar, divulgar, ler e ser lido. Quase todos os meus livros estão disponíveis para download gratuito. A internet é a minha maior aliada. As fronteiras nunca foram respeitadas por mim, e com a rede mundial de computadores eu consigo chegar a outras culturas, países, pessoas em diferentes partes do mundo. Mas não me limito à WEB. Faço questão de viajar, encontrar pessoalmente, participar de eventos ao vivo, palestras, feiras, festas etc. A rede é mais um instrumento. Não podemos nos limitar, senão seria mais uma fronteira fechada.


- Fala pra gente como está o cenário poético no Brasil? Novidades?

Acredito que haja milhões de poetas no país. A maioria engavetada, por medo, vergonha ou falta de incentivo. Falta estímulo nas escolas, pois a educação atual é voltada para preparar pessoas para o mercado de trabalho, que é mecânico, mercantilista e que só visa a produção em larga escala. Mas também há muitos poetas e escritores se lançando por conta própria no mercado editorial, bancando suas publicações e participando de eventos literários. Qualquer olhada nos sites de literatura dá para perceber a diversidade de nomes e temas. Ainda falta direcionamento, políticas públicas para acolher esses artistas da palavra. Aqui e ali, os governos e iniciativa privada vão fazendo ações pontuais, mas ainda não dão conta ou não conseguem dimensionar o potencial dessa produção.
Poesia é algo sublime, literatura em geral é produzida com muita arte é sensibilidade e precisa de tempo e espaço, o que hoje em dia custa caro. A corrida da vida exige resultado financeiro imediato, para comprar carro, morar em bairros “nobres” etc. A competição pela sobrevivência no mundo atual é algo insano, sendo necessário matar uma manada de animais gigantes todos os dias, para juntar umas moedas. A concorrência do mercado e da vida atropela a arte, aumenta o custo de produção. Sobrevivem alguns artistas, a custa de sacrifícios cada vez maiores. A maioria fica na marginalidade, fora das prateleiras, quase sem alcançar possíveis leitores/consumidores. Há muito potencial, porém ainda não existe como escoar tudo o que se produz ou se pode produzir.


- Para finalizar, deixe um comentário a quem vem a ler o blog.

Minha Paixão por Livros

Por: Valdeck Almeida de Jesus

O primeiro contato com os livros foi aos seis anos, quando comecei a estudar. Na época, morava na periferia de Jequié com minha mãe, meu pai e três irmãos menores. Meu pai era analfabeto e trabalhava roçando os campos. Minha mãe, também analfabeta, era do lar. Miséria e pobreza sempre nos castigaram. Tínhamos tudo para não dar certo.

Felizmente as “letras” cruzaram minha vida. Ao chegar à escola, troquei os brinquedos rudimentares por cartilha, ABC e tabuada. Era um mundo fascinante e desafiador: os desenhos dos livros, a dança das letras e os segredos dos números. Quando a professora Lina lia as histórias de “Alice”, eu e Valquíria, minha irmã, ficávamos extasiados. “Viajávamos” na magia dos contos infantis e esquecíamos os problemas do dia-a-dia. Tive a sorte de ter contato com livros de uma forma lúdica, diferente do didatismo convencional que caracteriza as escolas. As lições de casa eram leitura e releitura do texto aprendido na classe. Sem o esforço da mamãe, esta tarefa seria impossível.

Tão logo comecei a dominar as letras, passei a devorar tudo que via pela frente: de bula de remédio a rótulos de xampus, de manuais de eletrodomésticos a jornais diversos, de revistas coletadas nos lixões a placas de trânsito. Quanto mais lia, mais fascinado ficava.

Com meu pai hospitalizado em São Paulo, minha mãe decidiu ir à luta para garantir a sobrevivência dos filhos. Arrumou trabalho numa fazenda distante. Tivemos que nos mudar. Eu ajudava minha mãe nos serviços. Apesar de não conhecer as letras, ela conhecia bem a dureza de não se ter estudo e matriculou os filhos na escola rural. Ensinei minha mãe a ler e escrever.

Na fazenda, pude ter acesso ao mundo dos gibis. Havia na sede um gabinete lotado de história em quadrinhos, que Dona Luci Valverde, a proprietária, me permitia frequentar. Quando ela viajava, eu dava um jeito de entrar pela janela e pegar algumas revistas. Lia-as com avidez. Depois voltava para devolvê-las. Foi a melhor fase de minha vida: de um lado, a integração com a natureza; do outro, os gibis a povoar meus olhos e meu imaginário.

Foram cinco maravilhosos anos até retornar a Jequié para continuar os estudos e mergulhar de vez na literatura. O primeiro encontro com a poesia surgiu quando comprei uma série de três livretos de poemas. Foi um caso de amor. Enlouqueci com aquela nova linguagem, repleta de rimas, conotações e lirismo. Decidi ser poeta e comecei a rabiscar os primeiros versos. Depois veio o Cordel, e minha cabeça deu um nó: seguir as regras da construção lírica tradicional ou escrever livremente como os cordelistas? Para piorar, chegaram Augusto dos Anjos, Castro Alves e outros. Acabei perdendo o pudor em relação aos preciosismos e me libertei das formas cartesianas. A maturação deste processo levou-me a criar novos e intensos poemas. Poemas que retratavam desde as desgraças vividas aos desabafos de um jovem sufocado pelo sonho de mudar o mundo.

Na fase de militância estudantil e política, passei a ler e a escrever para jornais de luta operária, o que me abriu novos horizontes. Fui devorador de livros na Biblioteca Municipal de Jequié, que me inspirou a fundar uma biblioteca em casa e emprestar livros e revistas para a vizinhança.

Era um viciado. E viciei muita gente a descobrir que o mundo tem outras cores e dores, além das óbvias. Vivo para plantar a semente da leitura e da reflexão. Acredito que ler não é só decodificar signos. É muito mais. É decifrar o subliminar e as entrelinhas. É compreender a vida como um todo. Vejo o mundo como um complexo do qual sou parte e onde devo agir responsavelmente em relação a mim e a meu próximo. Guiado por esta visão, hoje não só escrevo meus livros como incentivo a criação literária pelo país afora. Com projetos de publicação de poemas de autores anônimos, palestras em escolas e universidades, sei que abro uma porta importante. O objetivo primordial da leitura é a transformação do cidadão na força motriz de seu próprio destino e do mundo.


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2 comentários:

  1. Obrigado ao amigo Leonardo Pacheco pela oportunidade em ser publicado no seu blog.

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    1. É um prazer ter amigos das letras agrupado nesse blog, que tem sua finalidade apenas em divulgar, o novo, o que existe de bom na literatura brasileira. Abraço literário!

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